Um livro que se passa na cidade de Salvador do século XIX, retrata a Revolta dos Malês e aborda escravidão, ao mesmo tempo em que reflete atuais desrespeitos aos direitos humanos, desperta grandes debates. Para entender como foi o processo criativo da produção do lançamento Dois levados numa jangada, entrevistamos Corisco Moura, pseudônimo de Rodrigo de Novaes Lima. Confira como foi o bate-papo com o autor:
O que ou quem inspirou você a começar a escrever?
Corisco Moura: Sempre gostei de ler. Quando eu tinha onze, doze anos, uma escritora visitou o nosso colégio. Era uma legítima contadora de histórias. Desde então, decidi começar a escrever.
Como foi o processo de pesquisa para a construção de Dois levados numa jangada?
C.M.: A elaboração de um romance ambientado na Salvador do século XIX foi, para mim, uma grande diversão. Pesquisei muitos temas, como a linguagem coloquial na primeira metade do século XIX, os detalhes do território urbano da capital baiana, as religiões e a cultura dos africanos. Contei também com a experiência de Tatiana Tozzi, especialista em religiões de matriz africana, e com as obras do pesquisador João José Reis, entre outros.
Por que escolheu a Revolta dos Malês como pano de fundo do livro Dois levados numa jangada?
C.M.: A história por trás do romance é um tanto curiosa. Antes dele, escrevi “A última aldeia”, uma novela pouco pretensiosa, que talvez por isso foi muito pouco divulgada. Eu me penalizava pelo fracasso desse primeiro projeto, enquanto casualmente assistia um documentário sobre a África. Então, embalado no desejo de fazer algo melhor, pensei em toda a estória, a ideia de um enredo cativante, em contato com temas sensíveis que me interessam. Sentia necessidade de falar sobre essas coisas, particularmente no contexto atual de perda de direito das minorias. O artista precisa falar. A Revolta dos Malês é um episódio precioso da nossa História, felizmente muito documentado, pelos autos que se seguiram a rebelião, o que muito ajudou na construção do romance.
Os personagens de Dois levados numa jangada possuem características bem particulares e distintas. Com qual deles você mais se identifica? Por quê?
C.M.: Não me identifico com nenhum personagem em particular. Alguns deles, sim, guardam traços pessoais, mas costumo usar amigos e conhecidos, pessoas que admiro, para pensar os personagens.
De que forma sua carreira na saúde pública influencia na sua escrita?
C.M.: Atendendo os pacientes nos postos de saúde, aprendi a gostar de gente. Pude me aproximar das pessoas, entender as suas dificuldades, advogar por elas, porque a literatura é também uma ferramenta social.
O que espera despertar nas pessoas com Dois levados numa jangada?
C.M.: Nesse romance, espero despertar a curiosidade que existe em todo livro, no tocante ao enredo, ao futuro dos personagens. Atrás de tudo isso, profundamente, tento trazer ao público o interesse pela nossa História e, principalmente, a sensibilidade para temas atuais como o racismo e a luta dos grupos minoritários, embate esse que infelizmente pouco mudou depois de tantos anos.