Os direitos sexuais e reprodutivos podem ser considerados uma extensão dos direitos humanos, tendo se originado com o movimento feminista e a luta por liberdade e autonomia em relação ao corpo, ou seja, o direito de escolher maternidade, contracepção ou aborto, por exemplo. A concepção feminista de direitos reprodutivos problematiza as relações de gênero na família e nas políticas de planejamento familiar, no sentido de estabelecer uma maior equidade de gênero. No Brasil, a proteção dos direitos humanos é garantida pela Constituição Federal. Apesar das minorias sexuais não estarem ali contempladas e de não haver ainda referências à orientação sexual ou à identidade de gênero, muitas decisões significativas no sentido da garantia de direitos dessa população foram viáveis em função da Constituição. No entanto, o livre exercício dos direitos sexuais e reprodutivos ainda não é uma realidade, em especial para essas pessoas.

Cuidar da saúde, inclusive sexual e reprodutiva, é um direito das pessoas trans, explica a ginecologista da EMEG Patrícia Almeida. “Pensar no atendimento ginecológico a travestis, transsexuais e pessoas não binárias é pensar muito além das modificações corporais que a hormonioterapia cruzada pode promover durante a adequação do gênero. É muito importante que a gente pense na saúde integral, na saúde sexual e na saúde reprodutiva dessas pessoas”. De acordo com a médica, quando se é muito jovem, geralmente ainda não se tem firmado o desejo de ter ou de não ter filhos(as). “Diante disso, é muito importante que esses corpos sejam cuidados no intuito de garantir a preservação dos óvulos ou dos espermatozoides, caso esse desejo por filhos seja apresentado no futuro”, destaca.

Muitos homens trans e pessoas transmasculinas que tentam acessar o sistema de saúde, principalmente o sistema ginecológico e obstétrico, sofrem com violências de todos os níveis. Diante de uma medicina “castrativa”, para muitas dessas pessoas, engravidar e seguir com a gestação nem sempre é apresentado como uma opção. Por outro lado, também é papel do ginecologista apresentar as opções disponíveis quando o paciente não deseja engravidar. “A testosterona, quando utilizada, leva a uma parada da menstruação, que pode ocorrer desde a primeira aplicação ou em aplicações futuras. Isso ocorre devido a um bloqueio hormonal. Quando esse bloqueio hormonal não é total, pode levar ao risco de gravidez. Então, é importante que as pessoas que usam testosterona e que tem a relação pênis/vagina façam uso de métodos contraceptivos para evitar uma gravidez indesejada”, explica.

Também é possível voltar a ovular e, consequentemente, a menstruar, após parar de fazer uso da testosterona, indica Patrícia. “Inclusive, é o que recomendamos para as pessoas que desejam uma gestação. Quando essa gestação ocorre em uso da testosterona é recomendado que a hormonização seja suspensa porque, durante a gravidez, usar esse hormônio pode levar à virilização do feto”. Já no caso de uma gestação programada, em que a testosterona foi suspensa previamente, é possível que se faça a amamentação depois do nascimento da criança, período em que também não se deve fazer uso da hormonização.