Riachão é um importante representante do samba baiano, músico de muita popularidade e de longa estrada, autor de mais de 400 composições, e tem como características marcantes a criatividade, a energia e o humor. “Agora chegou a vez da minha estrela brilhar”, disse Riachão, sem conseguir disfarçar a empolgação em poder gravar mais um disco – o de estreia foi lançado em 1991, financiado pelo Desembanco, empresa na qual trabalhou como contínuo até se aposentar. Desta vez, a produção foi bem mais caprichada. Cantam ao lado do compositor, admiradores como Caetano Veloso (em Vá Morar com o Diabo), Tom Zé (Cada Macaco no Seu Galho), Dona Ivone Lara (Até Amanhã), Roque Ferreira (Quem É o Dono Dessa Mulher?), Carlinhos Brown (Pitada de Tabaco) e Armandinho (Choro Número 1). O CD foi distribuído pela gravadora Velas.

“Gravar com toda essa gente foi motivo de grande satisfação para mim. Cantar junto com Dona Ivone, uma grande mulher, nem se fala”, elogia Riachão, que conta ter tirado o título do álbum, Humanenochum, do nome de uma organização criada por ele para homenagear as mulheres, história que explica em uma das faixas do disco. O produtor Paquito diz que procurou fazer um resumo da obra de Riachão, seguindo os mesmos critérios usados para lançar o disco em homenagem a Batatinha – outro ícone do samba baiano – em 1997. “São dois grandes compositores, que gozam de muita popularidade na Bahia, mas que estavam um pouco deixados de lado”.

Paquito e J. Velloso tiveram dificuldade para selecionar as 19 canções do disco. Riachão criou fama de ser um compositor voraz e hoje gaba-se de ter no baú mais de 400 escritas. “Quando chegava na Rádio Sociedade, em Salvador, o Antônio Maria (o célebre jornalista, radialista e compositor pernambucano) anunciava: ‘Lá vem o homem que nunca cantou as músicas dos outros’”, lembra, orgulhoso. Além da facilidade de criação, Riachão é bom de improviso. Marcou época transformando fatos e acontecimentos da cidade em crônicas musicais. O que era notícia em Salvador não escapava de suas ironias.

O compositor lembra que, na década de 60, os norte-americanos trouxeram a baleia Moby Dick (coisas de americano) embalsamada para ser exposta em plena Praça da Sé. “Estava caminhando pela Rua Chile quando vi uma multidão se encaminhando para a Praça. Quando cheguei lá vi um monte de gente olhando aquela baleia e perguntei para mim mesmo: ‘Ué, esses gringos são loucos, o mar tá lá embaixo, perto do comércio’. Resolvi compor uma música na mesma hora, Baleia da Sé, um dos meus grandes sucessos de rádio”, recorda.

Outros fatos não escaparam do improviso de Riachão, como o Incêndio do Mercado Modelo (ponto de encontro de sambistas nos anos 40 e 50, onde o compositor garante que lutou muita capoeira na visita da rainha da Rainha Elizabeth) e a chegada de uma enorme tartaruga, vinda da América do Norte, às praias de Salvador. Porém, quando tinha de falar sério, Riachão também caprichava na poesia, como em Barriga Cheia, censurada pela ditadura militar nos anos 70: “Eu, de fome vou morrer primeiro/ Você, de barriga cheia, também vai morrer um dia.”