É a primeira vez que a diretora Debora Dubois e a atriz Mel Lisboa visitam o reinado de William Shakespeare como profissionais.
A viagem sem volta se dá no terreno maquiavélico de “Otelo”, que chega em Salvador, para duas únicas apresentações, dias 28 e 29 de maio, no Teatro Isba.
“Acho que a gente nunca está pronta para nada, mas estou tentando desmistificar Shakespeare, tratar ‘Otelo’ como mais uma montagem entre tantas que já existiram e vão existir”, diz Lisboa.
Dubois também busca se esquivar da reverência. Usa a tradução de Maria Silvia Betti para facilitar o entendimento. O texto –o mesmo usado numa montagem premiada de Marco Antônio Rodrigues, em 2003– mantém a poesia por meio de uma linguagem bastante acessível.
A encenadora torna “Otelo” mais próximo do brasileiro. “Nosso Otelo é baiano, traz a origem do país”, resume Dubois, que, além de atualizar a poética, mescla os versos do bardo inglês a cinco músicas de Caetano Veloso e abusa da percussão em cena.
O general de Veneza Otelo (Samuel de Assis), por exemplo, declara ao pai de Desdêmona o amor por sua filha (Lisboa), tendo a seu favor não apenas o belo solilóquio criado por Shakespeare, no qual confessa sua superioridade física e inferioridade intelectual, mas também a música “Terra”, de Caetano Veloso.
Dubois elegeu “Otelo” sobretudo pela temática do preconceito. Para ela, o personagem-título –um ex-escravo, rude no manejo das palavras e nobre no das armas–, domina força, e não amor.
Não consegue entender como traição o discurso corrosível de Iago, capaz de envenená-lo de ciúmes ao sugerir que sua Desdêmona mantém um caso com Cassio.
“A raça negra ainda se coloca em posição de inferioridade. Este é o ponto fraco de Otelo. Ele não está acostumado a ser bem tratado, a poder conquistar uma pessoa que está acima dele, por isso cai na armadilha barata de Iago”, acredita Dubois.
Sob o palco despojado de artifícios cênicos, concebido para privilegiar texto e trabalho de ator, todos os personagens iniciam suas jornadas em túmulos e, ao término da tragédia, retornam a eles. O percurso evoca o movimento cíclico da humanidade: “A gente pode dizer que o racismo diminuiu, mas ele continua a existir. As gerações estão sempre se repetindo”, explica Dubois.
Ela buscou acentuar a curva descendente de Desdêmona. A personagem inicia a peça como uma jovem esperançosa sobre seu futuro ao lado do marido que ama.
No final, parece ter se tornado uma velha senhora. “É o sofrimento que faz com que ela envelheça. Na verdade, passaram-se apenas quatro dias”, enfatiza Lisboa.
“OTELO”
QUANDO: Sábado e Domingo, dias 28 e 29 de maio de 2016.
ONDE: Teatro Isba em Ondina.
QUANTO: R$ 80,00 Inteira e 40,00 Meia
CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS