Após dois meses de residência artística com o grupo PHILA7 e pequena temporada no Teatro Centro da Terra, na capital paulista, o Coletivo Coato – formado por estudantes da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia – estreia no próximo dia 28 de abril, no Teatro Martim Gonçalves, o seu mais novo trabalho “Eu é outro: Ensaio sobre Fronteiras”, que discute a permissividade de aproximação que existe entre os sujeitos e como o “Outro” torna-se potencial criativo capaz de alterar o estado coletivo.

O trabalho, que o grupo gosta de chamar de Superfície de Eventos, ao invés de espetáculo, transita entre a performance, dança, música, visuais e tecnologia. “Esta superfície de eventos é um espaço propicio ao novo, ao olhar no outro, desse outro que vem a cada noite trazendo o novo. O público que vai nos assistir é um criador em potencial, portanto temos que considerá-lo como tal. Falar do outro é falar de si mesmo”, explica o diretor do espetáculo Marcus Lobo, indicado na Categoria Revelação do Prêmio Braskem de Teatro, pela direção do espetáculo Maçã.

De acordo com a atriz e performer Simone Portugal, este trabalho é um processo peculiar para dar voz a uma trama-turgia processual, inacabada, aberta e desejante a ser composta por aqueles que os visitará a toda noite. “O que nos mobiliza? Entender como se estabelecem as fronteiras, aquela mais imperceptível, a fronteira do OUTRO, esse que nos atravessa, que provoca sensações, que nos impede, que nos espelha”, reflete Portugal.

No processo criativo da superfície de eventos, o coletivo provocou uma ruptura entre seus integrantes: as equipes de trabalho foram separadas e foi proposto um processo de montagem pautada nas relações a distância através dos meios de comunicação virtuais. “Conseguimos provar a frieza e o calor do desejo de estar perto e assim entender os limites de aproximação permitidos pela presença carbónica (física, toque, perto, palpável) e a presença silício (virtual, mediada por telas, conectada), desejando sempre o toque”, descreve Marcus Lobo, que assume a direção do trabalho.

Foi desta forma que descobriram que as fronteiras se erguem quando se percebe a presença do OUTRO. “Esse ser tão complexo e potente, eles existem e estão por toda parte dentro de suas rodas gigantes esperando um olhar que entrega, um olhar cúmplice, um sussurro, um sopro, um clique, ele deseja ser visto/percebido”, pontua o ator Danilo Lima.

A noção de fronteira coloca a ideia do limite. Ao levar em conta esta percepção, para o COATO a liminaridade somos nós todos. “Não só é só o fato de atravessar e, sim, de como é que isso acontece. A questão com a liminaridade é que não é só um conceito antropológico que tem a ver com os ritos de passo. Abrange as noções de territorialidade sejam físicas, simbólicas, imaginárias, poéticas, políticas, sociais. Esse trânsito nos transforma quando conseguimos compartilhar a respiração com o outro”, filosofa Marcus Lobo.

O COATO teve o prazer de vivenciar dois encontros especiais durante esse processo, o primeiro foi com a Ivani Santana mentora do Grupo de Pesquisa Poéticas Tecnológicas – BA, e com Rubens Velloso e Marcos Azevedo diretores do PHILA7 – SP. Os dois grupos são reconhecidos mundialmente no estudo da “imagem e da tecnologia como ferramentas para o desenvolvimento de novos caminhos para as artes cênicas”.

“Encontros que modificaram os percursos e nos colocaram num novo trilho, ativaram um novo olhar sobre às fronteiras físicas/duras/territoriais e nos colocou numa rota poética/metafórica/visual, nos ensinou a respirar junto. Partimos em busca de romper com as fronteiras e avançar sempre em direção ao desconhecido, afinal além do horizonte, mais horizonte há, a travessia é constante e cada passo à frente diminui um pouco mais a distância e nos faz OUTRO”, descreve Marcus Lobo.

A tecnologia chega justamente como a engrenagem que faz o fluxo da cena girar, ela estará por toda parte dando suporte e colaborando com o trabalho dos performers. Em “Eu é outro: Ensaio sobre Fronteiras”, o coletivo Coato investe nas imagens cinematográficas, na interatividade telemática e no uso de mídias para provocar sensações plurais onde cada singularidade desejante (povoamento), a partir do seu repertório, poderá criar as suas próprias imagens.

“Tentaremos juntos vivenciar essa travessia a cada noite. Pois não temos respostas prontas, não há uma liturgia a ser ministrada naquele palco. O que vai acontecer é uma experiência orgânica, onde nos entregaremos ao encontro desses OUTROS que virão. Vamos respirar juntos esse ar que gira ao redor dessa grande roda gigante chamada planeta Terra. Nossa sombra projetada no chão é um sinal de que ainda estamos vivos”, realça Simone Portugal.

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